Lilia Schwarcz e André Botelho

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    simPsio: cinco Questes sobre o

    Pensamento social brasileiro

    Lilia Moritz Schwarcz

    Andr Botelho

    1 Como voc v a rea de pesquisa do pensamento social

    brasileiro atualmente? Quais so seus principais objetos,

    problemticas e abordagens terico-metodolgicas?

    Anglica Madeira (UnB) e Mariza Veloso (UnB): A rea deestudos em pensamento social brasileiro ensino e pesquisa encontra-se bastante consolidada na academia brasileirae pode-se mesmo consider-la em ranco crescimento. Istopode ser constatado se observarmos a demanda por par-

    te dos estudantes, assim como de pesquisadores que, comtrabalhos renovadores, dotam a rea de maior densidade,tanto com a releitura dos clssicos quanto com perspectivasmetodolgicas que contribuem para a abertura de novoscampos empricos de investigao.

    Elide Rugai Bastos (Unicamp): Como em todo pensamento,

    est presente na rea uma gama de posies que se opem,se completam, dialogam, entram em conronto, o que trazriqueza ao debate. Reconheo pelo menos trs grandeslinhas, cada uma apresentando abordagens internas diversas:

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    a contextualista, a textualista e a que, reconhecendo a tensoexistente entre os dois termos, prope uma anlise que leveem considerao tal tenso. As vrias ormas de denio doobjeto so resultado da adoo de diversos mtodos, pois ummtodo no est sozinho no campo interpretativo, entran-do em confito explcito ou implcito com outros mtodos;de outro modo estaria propondo dogmas e no anlise.

    Assim, tm lugar na refexo as ideias, seu impacto sobre arealidade, seu eeito poltico, o itinerrio dos intelectuais, olugar poltico-social que ocupam, as polticas culturais que os

    beneciam ou no, as instituies que os acolhem.

    Glaucia Villas Bas (UFRJ): Nos ltimos trinta anos, emque tenho atuado nesta rea de conhecimento, houve umcrescimento sensvel do interesse pelo tema do pensamen-to social, interesse que se observa na criao de grupos depesquisa, publicaes, ormao de pesquisadores e inclu-

    so da disciplina em cursos graduao e ps-graduao. uma rea cujo objetivo compreender quais as ideias quese produziram sobre o pas, como oram elaboradas e emque contexto intelectual ou instituio, como circulam eso recebidas. H alguns problemas recorrentes no conjun-to das pesquisas que dizem respeito identidade nacional eao desenvolvimento moderno da sociedade brasileira. Mas

    h tambm estudos sobre a institucionalizao das cinciassociais, sobre livros e editoras. Naturalmente que a rea nose restringe s ideias sobre o pas, mas a grande parte daspesquisas ainda acata esta orientao.

    Lucia Lippi Oliveira (CPDOC/FGV-RJ): Quando se pensaque a rea de pesquisa est decrescendo, ela retorna rme e

    orte! Creio que cada nova gerao reaz o caminho; comose precisasse rever a produo intelectual voltada para asinterpretaes do Brasil. Pode-se considerar isto um processode construo de identidade dos praticantes da rea. Os obje-

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    tos que compem o elenco da rea tem sido, entre outros,autores, obras, revistas, instituies, correntes de pensamen-to, movimentos artsticos, academias, editoras, colees. Asproblemticas que guiam as anlises levam a indagar sobretrajetrias; redes de sociabilidade; processos de produo,divulgao e recepo de obras; convergncias e divergn-cias no campo intelectual. O que guia tais anlises so qua-se sempre questes a respeito da estruturao do campo (Bourdieu) e/ou o interesse em chegar a uma compreensohistrico-sociolgica do mesmo ( Norbert Elias).

    Luiz Werneck Vianna (Iesp/Uerj): A rea de pesquisa uni-versitria em pensamento social brasileiro est em expan-so, consolidada nos principais cursos de ps-graduaoe objeto de um nmero crescente de dissertaes de mes-trado e de teses de doutoramento. Pode-se sustentar que,embora os estudos dedicados rea tratem de uma grande

    diversidade de temas, persiste entre eles uma diundida esempre renovada orientao no sentido de se investigar ascondies particulares que presidiram a revoluo burgue-sa no Brasil. Sob essa grande angulao, que pe em evidn-cia o ato capital de que transitamos para o moderno semromper com as oras da tradio, a maior preocupao daliteratura tem sido a de identicar, por dierentes objetos e

    estratgias de pesquisa, a gnese do que seria o autoritaris-mo poltico constitutivo ormao do pas.

    Maria Arminda do Nascimento Arruda (USP): Penso que area do pensamento social e interpretaes do Brasil cres-ceu e tornou-se consideravelmente mais complexa nos lti-mos anos. visvel o volume de trabalhos publicados nessa

    rea temtica, como tambm pondervel a diversidadedos assuntos e das abordagens. A despeito disso, domina,em minha opinio, o tratamento dos intelectuais que mar-caram a vida cultural brasileira, examinados seja no prisma

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    das suas trajetrias individuais, seja na perspectiva da suagerao. H tambm ntida concentrao de estudos na gera-o de 1930, analisada em vrias dimenses, revelando apreerncia pelos chamados ensastas modernistas. Do pon-to de vista terico-metodolgico, creio que h grande diver-sidade, o que , em princpio, muito bom. Porm, tendoem vista o carter variado dos estudos, conunde-se, muitas

    vezes, diversidade com carncia de rigor, visvel na constru-o de puros retratos das personagens em escrutnio.

    Renan Freitas Pinto (Ufam):Vejo como uma oportunidadede identicarmos a pluralidade do pensamento brasileiroem vrios sentidos e direes, possibilitando, por exemplo,o conhecimento sobre as ormas regionais e locais em que opensamento se expressa e se dierencia.

    Ricardo Benzaquen de Arajo (PUC-RJ e Iesp/Uerj):A rea

    atingiu um amadurecimento intelectual bastante signicativo,tendo j mapeado, ao menos at certo ponto, parte dos maisimportantes debates sociolgicos do sculo XX. Ela tambmdesenvolve, h tempos, um esoro no sentido de examinarde orma mais sistemtica o pensamento social do sculo XIX.Isto no que diz respeito aos temas. Quanto s abordagens, a

    velha oposio entre uma perspectiva que privilegia a anlise

    interna dos textos e uma outra que procura explic-los pelodestaque concedido ao contexto em suas mltiplas dimen-ses , comea a conviver com posies que buscam combinaresses dois pontos de vista e portanto matizar aquela oposio.

    Roberto Motta (UFPE): Acho que o principal objeto ouproblemtica da rea a compreenso do Brasil, como or-

    mao histrica, social, cultural e poltica. Tudo gira em tor-no disto e dos projetos de Brasil, explcitos ou implcitos.No uma disciplina gratuita, mas muito carregada detenses e opes tericas e prticas.

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    Rubem Barbosa Filho (UFJF):Vejo como uma rea de pes-quisa extremamente promissora, tanto pelos grupos de tra-balho existentes na Anpocs e na SBS quanto pelo interesseque o tema desperta na academia em geral. No sei se possvel caracterizar a predominncia de uma abordagemterico-metodolgica, mas certamente a chave mecni-ca estrutura-superestrutura cedeu espao a perspectivasmenos esquemticas, como a da Escola de Cambridge.Creio que os problemas bsicos estudados so aqueles que

    vinculam o nosso pensamento social construo da nao

    e questo da solidicao da democracia, com os dilemasenvolvidos em cada etapa de nossa histria e com a constru-o de linhagens ou liaes tericas dos vrios autoresestudados.

    Sergio Miceli (USP):A julgar pelo recente encontro cariocado grupo1, continua havendo, no meu entender, duas ten-

    dncias: de um lado, uma abordagem contextualista, paraa qual os textos ou obras esto como que imantados, deoutro, um enoque na linhagem da histria das ideias, incli-nado a azer parrases, aproximaes postias entre livrose autores, ou ento construindo uma perspectiva um tan-to espiritualizada de interpretao. A linhagem contex-tualista busca construir uma histria densa de mediaes,

    desde origens sociais, passando pela ormao cultural, atos modos de insero na cena intelectual ou artstica; osadeptos da histria das ideias lidam com autores e livros,como se estivessem dispostos num quadro de honra/deson-ra, extraindo desses conrontos linhagens de pensamentodenidas em termos anacrnicos. Em ambas direes, veri-cam-se prodgios de erudio por vezes dispensveis.

    1 Sergio Miceli se reere ao Encontro Intermedirio do GT Pensamento social noBrasil da Anpocs, Pensamento Social: perspectivas em dilogo, organizado porNsia Trindade Lima (Fiocruz), ngela Alonso (USP) e Andr Botelho (UFRJ) erealizado no IFCS/UFRJ em novembro de 2010.

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    2 Como voc v a relao entre a rea de pensamento

    social e as cincias sociais em geral, e/ou outras disciplinas

    e reas de pesquisa?

    Anglica Madeira e Mariza Veloso: Pensamento social bra-sileiro uma rea que se constri em uma proximidadecada vez maior com a teoria sociolgica, clssica e contem-pornea congurao histrica (Elias); Intelligentsia(Man-nheim); campo intelectual (Bourdieu) assim como comas cincias da linguagem, com um acervo de conceitos que

    permitem operar sobre os textos, examinar as narrativas dialogia (Bakhtin); intertextualidade (Kristeva) a partirdas novas teorias do discurso e da narrativa praticadas pelacrtica cultural contempornea.

    Elide Rugai Bastos: A rea de pensamento social supeinteraces com muitas disciplinas: losoa, histria, socio-

    logia, poltica, antropologia etc. Alis, como toda a refe-xo no s em cincias sociais, mas no mbito das cinciashumanas. Assim, dialoga com vrias vertentes terico-meto-dolgicas clssicas, modernas e contemporneas. Esseprocedimento conjunto permite que sejam ultrapassados oslimites da experincia pessoal para torn-la social, vinculan-do a refexo individual de outros pesquisadores. Lem-

    bro Isaiah Berlin que diz que novas ou velhas, as ideias or-mam o capital intelectual bsico com o qual vivemos. Ou,em outras palavras, o pensamento no parte de um espaodesabitado pelo conhecimento.

    Glaucia Villas Bas: A rea de conhecimento que se con-vencionou chamar de pensamento social se imps e se

    legitimou dentro das cincias sociais tal como, ainda, a con-sideramos no Brasil, constituda pelas disciplinas da socio-logia, antropologia e cincia poltica. H historiadores quededicam suas pesquisas rea de pensamento social e, ima-

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    gino que especialistas da educao, direito ou losoa tam-bm o aam. Vale dizer, contudo, que h cientistas sociaisque no consideram pensamento social uma rea de conhe-cimento com questes e mtodos prprios, julgando quequalquer pesquisador pode produzir conhecimento sobreum autor ou tema da tradio de estudos sobre o Brasil.No h dvida alguma que isto possvel, e mesmo salu-tar para a pesquisa. Todo saber que se preza pensa sobre siprprio. No entanto, ao uma dierena entre o cultivo eo domnio desta rea (que tambm chamada de sociolo-

    gia do conhecimento, histria intelectual, historia social dasideias, sociologia da cultura) e trabalhos de especialistas emsociologia urbana ou sociologia da violncia, por exemplo,que, em determinado momento, desejam escrever um arti-go sobre Gilberto Freyre, Capistrano de Abreu ou RobertoCardoso de Oliveira, porque zeram uma leitura importan-te para sua refexo ou pesquisa.

    Lucia Lippi Oliveira: A rea de pesquisa toma questes dasociologia e da antropologia disciplinas que procederama avaliaes histricas de si prprias para realizar anlisesdos objetos acima mencionados. Ela se distancia da cinciapoltica e da economia como praticadas hoje em dia j quetais disciplinas adotaram princpios mais ormalistas, mais

    calcados em modelos que tomam o indivduo como centrode decises racionais. Ou seja, a rea se relaciona melhorcom as cincias sociais, aqui incluindo a histria e a geogra-a, entendidas como humanidades.

    Luiz Werneck Vianna: Por denio, o estudo dessa disciplinaconsiste sempre em um exerccio de teoria social, em que a

    mobilizao das obras clssicas desse campo ocupa um papelnotoriamente privilegiado. Estudar a presena do liberalismoentre ns remete a Guizot, a Stuart Mill e a Tocqueville, assimcomo a reerncia a Marx e a Weber torna-se incontornvel

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    nos casos em que a categoria Estado e a ormao das clas-ses sociais se apresentam como temas centrais na expressodo nosso pensamento. De outra parte, dado que esse campode pensamento, desde seus incios, oi orientado por umasociologia histrica comparada nosso caso conrontadocom o norte-americano , a literatura aplicada a essa perspec-tiva, como exemplarmente nas obras de Barrington Mooree Charles Tilly, trouxe consigo a abertura de novas oportu-nidades para exerccios de comparao. Da que, alm da

    Amrica, j se tornaram correntes os estudos sobre os casos

    russos, alemo e italiano, no toa esses ltimos envolvendoprocessos de modernizao discrepantes do modelo liberal--democrtico, vitorioso nos pases que realizaram revoluesburguesas clssicas, como a Inglaterra e a Frana. Na estei-ra dessa tendncia, Lnin e Gramsci vieram a azer parte dagaleria dos grandes autores de reerncia da disciplina.

    Maria Arminda do Nascimento Arruda: A rea do pensa-mento social , por essncia, interdisciplinar. A sua relaocom as cincias sociais intrnseca; creio que o desenvolvi-mento da chamada sociologia da cultura no Brasil, nos lti-mos anos, dependeu, entre outros motivos, do volume derefexes sobre os intelectuais, setor da especialidade atual-mente central.

    Renan Freitas Pinto:Acredito que o estudo sobre as ormasde pensamento social pode esclarecer aspectos essenciaisquando os dierentes campos disciplinares se interconec-tam. Para isso devemos ter em vista que as mudanas come-am a ocorrer sempre como mudanas no campo das ideias.

    Ricardo Benzaquen de Arajo: Embora tenha sido criada,pelo menos no que se reere Anpocs, com o objetivo dese limitar ao exame da produo intelectual elaborada,de maneira bastante estrita, no mbito das cincias sociais

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    da o grupo se chamar pensamento social no Brasil e nopensamento social brasileiro , a rea tambm se ocupa, hmuito tempo, com trabalhos oriundos da literatura, da cr-tica e da tradio ensastica, para mencionar apenas algunspoucos exemplos. O desao, agora, talvez seja o de nosrelacionarmos com estas outras disciplinas de maneira maisaberta, na direo de um dilogo, de um intercmbio inte-lectual mais amplo, matizado e complexo, procuo paratodos os envolvidos.

    Roberto Motta: Os quatro campos que destaquei anterior-mente tm, evidentemente, ntima relao com a disciplina.

    Acrescentemos a eles economia e histria econmica.

    Rubem Barboza Filho: Penso que as relaes com outrasreas deveriam ser intensicadas, em especial com a lo-soa ou teoria poltica e com uma refexo epistemolgica

    mais exigente. No quero supervalorizar a questo episte-molgica, mas ela necessria. Por outro lado, acho tam-bm que seria produtivo um contato maior com os histo-riadores. Vrios episdios e circunstncias de nossa histriaesto sendo revistos por eles, e creio que isso poderia nosajudar muito a entender melhor a refexo de vrios dosnossos pensadores. Finalmente, penso que seria interessan-

    te a comparao permanente com pensadores de outrospases que no os cannicos.

    Sergio Miceli: A chamada rea de pensamento social pre-servou esse ttulo histrico, que tem muito mais a ver comcerta prtica intelectual de interpretar o pas em chavemacro, embora a maioria de seus atuais praticantes decer-

    to se encaixe melhor em alguma das sociologias atuantesnesses universos de prtica social: sociologia dos intelectuais,histria social da arte, sociologia da literatura. Atraindocientistas sociais de variada procedncia disciplinar his-

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    tria, sociologia, antropologia etc. as prticas de investi-gao e de interpretao oram impelidas a dialogar com

    vertentes diversas da teoria sociolgica contempornea,desde Weber, Gramsci, Durkheim, passando por Raymond

    Williams, Pierre Bourdieu, Erving Goman, at as mono-graas incontornveis de Ringer, Christophe Charle, SteanCollini, entre outros.

    3 Quais os livros ou artigos da rea voc destacaria?

    Anglica Madeira e Mariza Veloso: So selecionadas narrati-vas clssicas de cada perodo histrico estudado, tanto lite-rrias quanto sociolgicas e histricas. Por exemplo, obrasde Joaquim Nabuco, Euclides da Cunha e Machado de Assispodem sugerir contrapontos sempre novos. Essa bibliogra-a bsica se az acompanhar de uma bibliograa crticasobre a poca e sobre os autores estudados. Dessa bibliogra-

    a azem parte, para a compreenso do sculo XIX, artigosde Machado de Assis e de Jos Verssimo, assim como seusintrpretes.

    Elide Rugai Bastos: Le dieu cach, de Lucien Goldmann; osestudos sobre o iluminismo de Franco Venturi; Goethe e seutempo, de Georg Lukcs; Consciousness and society, de Stuart

    Hughes; Le travail de loeuvre, de Claude Leort; Ideias polti-cas na era romntica, de Isaiah Berlin.

    Glaucia Villas Boas: Oliveira Vianna e o direito do trabalhono Brasil, em Quinze ensaios, de Evaristo de Morais Filho; Abrasilidade modernista:sua dimenso losca, de Eduardo

    Jardim de Moraes; Intelectuais e classe dirigente no Brasil(1920-

    1945), de Sergio Miceli;Joaquim Nabuco, de ngela Alonso.Lucia Lippi Oliveira: Dicil seleo! Vou citar cinco tesesde doutorado que oram publicadas em livro e cujos temas

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    se relacionam aos meus interesses de pesquisa: BeneditoCalixto e a construo do imaginrio republicano, de Caleb Faria

    Alves; Guerreiro Ramos e a redeno sociolgica:capitalismo esociologia no Brasil (no prelo), de Edson Bariani Junior; Osarquitetos da memria:sociognese das prticas de preserva-o do patrimnio cultural no Brasil (1930-1940), de Mr-cia Regina Romeiro Chuva; A terra como inveno:o espaono pensamento social brasileiro, de Joo Marcelo Maia;Projeto e misso:o movimento olclrico brasileiro, de LuisRodolo Vilhena.

    Luis Werneck Vianna: Sobrados e mocambos, de GilbertoFreyre; Razes do Brasil, de Srgio Buarque de Holanda; Aconstruo da ordem, de Jos Murilo de Carvalho; O quintosculo, de Maria Alice Rezende de Carvalho, Tradio e arti-cio, de Rubem Barbosa Filho.

    Maria Arminda do Nascimento Arruda: H vrios livrosimportantes, sendo, por isso, dicil eleger um nmero limi-tado de obras. Considero, no entanto, Intelectuais e classedirigente no Brasil, de Sergio Miceli, uma obra decisiva nadelimitao do campo da refexo, pois inaugura toda uma

    vertente de estudos sobre a histria social dos intelectuais.

    Renan Freitas Pinto: Pequena bibliografa crtica do pensamentosocial brasileiroe O rebelde esquecido: tempo, vida e obra deManoel Bonm, de Ronaldo Conde Aguiar; Vozes da Ama-znia:investigao sobre o pensamento social brasileiro, deElide Rugai Bastos e Renan Freitas Pinto; O espetculo dasraas:cientistas, instituies e questo racial no Brasil (1870-1930), de Lilia Moritz Schwarcz;Estilo tropical:histria cultu-

    ral e polmicas literrias no Brasil (1870-1914), de RobertoVentura; eFormao do pensamento poltico brasileiro:ideias epersonagens, de Francisco Weort.

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    Ricardo Benzaquen de Arajo: H uma srie de trabalhos degrande valor publicados nos ltimos anos, o que torna muitodicil escolher um sem deixar outros, de mrito equivalente,na sombra. Assim, prero destacar a relevncia do ensino eda pesquisa sistemticos que tm sido desenvolvidos por Ser-gio Miceli, na USP, e por Luiz Werneck Vianna, no antigoIuperj. Sergio aproxima-se do pensamento social brasilei-ro pela nase, no exclusiva, em uma sociologia dos inte-lectuais; Werneck trata do tema por intermdio de um vis,igualmente no exclusivo, de uma sociologia poltica; ambos,

    porm, tm desempenhado um papel de enorme realce noesoro de se conerir dignidade intelectual nossa rea.

    Roberto Motta:Casa-grande e senzala, de Gilberto Freyre;Razes do Brasil, de Srgio Buarque de Holanda; Evoluopoltica do Brasil, de Caio Prado Junior; Neither black nor white,de Carl Degler; e Bandeirantes e pioneiros, de Vianna Moog.

    Rubem Barboza Filho: dicil dizer ou escolher. Pensandona produo mais contempornea, e sem ordem de impor-tncia, eu destacaria alguns estudos exemplares: Linhagensdo pensamento poltico brasileiro, de Gildo Maral Brando;A revoluo passiva:iberismo e americanismo no Brasil, deLuiz Werneck Vianna; A construo intelectual do Brasil con-

    temporneo:da resistncia ditadura ao governo FHC, deBernardo Sorj; O quinto sculo:Andr Rebouas e a constru-o do Brasil, de Maria Alice Rezende de Carvalho; Entrea autoridade e a liberdade, introduo ao livro Visconde doUruguai, de Jos Murilo de Carvalho.

    Sergio Miceli: As sociologias da religio, do direito e da

    msica, de Max Weber; A sociedade de corte, de Norbert Elias;As regras da arte, de Pierre Bourdieu; O campo e a cidade, deRaymond Williams; O declnio dos mandarins alemes, de FritzK. Ringer.

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    4 Voc ensina ou ensinou pensamento social como disci-

    plina? Na graduao ou na ps-graduao? Como disciplina

    optativa ou obrigatria? Quais os recursos didticos empre-

    gados em suas disciplinas?

    Anglica Madeira e Mariza Veloso: O curso Sociologiabrasileira, obrigatrio a todos os alunos da graduao doDepartamento de Sociologia da UnB, oerecido todos ossemestres, e recebe demanda de vrias reas das cinciassociais. O curso oerecido anualmente, para o mestrado

    e para o doutorado, com o ttulo de Pensamento socialbrasileiro. A disciplina existe tambm, desde 1993 com onome de Leitura brasileira I e Leitura brasileira II, oe-recidas respectivamente a cada semestre , no Instituto RioBranco do Ministrio das Relaes Exteriores. Tudo isso evi-dencia o grau de institucionalizao da rea.

    Elide Rugai Bastos: Tenho ensinado nos cursos de gradua-o em Cincias Sociais e ps-graduao em Sociologia naUnicamp, em disciplinas obrigatrias e optativas na rea depensamento social. No primeiro, Pensamento social bra-sileiro; no segundo, alternando Teoria sociolgica con-tempornea e Pensamento social no Brasil. Em Teoriasociolgica contempornea, disciplina obrigatria, parto

    da indagao sobre o cenrio a partir do qual se d a reo-rientao do pensamento social europeu no sculo XX eseus desdobramentos na sociologia norte-americana. Nessecenrio procuro apontar as transormaes poltico-sociaise culturais que undamentam a circulao das ideias. EmPensamento social no Brasil, sugiro como eixo o ato deque em cada momento de congurao da questo nacio-

    nal altera-se o peso dos temas abordados pelos intrpretes/pesquisadores. Nessa linha a recepo de autores europeuse norte-americanos e o dilogo estabelecido entre brasilei-ros e latino-americanos so dierenciados no tempo.

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    Glaucia Villas Bas: Ensinei na graduao e na ps-gradua-o. Comecei nos anos de 1980 no curso de cincias sociaisda UFRJ. Era uma disciplina eletiva sobre as interpretaesdo Brasil, que atraa um nmero razovel de alunos. Cos-tumava escolher trs ou quatro obras paradigmticas paraleitura e discusso. At hoje encontro ex-alunos que se lem-bram deste curso. Na realidade, o currculo oerecia poucoou quase nada sobre autores brasileiros na rea da sociolo-gia. Ao nal da dcada de 1980, creio, Ana Maria Galano eeu zemos uma ementa para a disciplina de Sociologia III

    cujo objetivo era oerecer um curso inormando sobre ascaractersticas histricas, sociais e cognitivas da sociologiano Brasil. Na criao do Programa de Ps-Graduao emSociologia e Antropologia (PPGSA), a rea de pensamentosocial entrou na linha de pesquisa Sociologia da cultura,ritual e simbolismo cuja proposta oi eita por mim, AnaMaria Galano, Reginaldo Gonalves e Maria Laura Viveiros

    de Castro. Tnhamos um projeto integrado nanciado peloCNPq sobre temtica do pensamento social e resolvemospropor esta linha de pesquisa durante a elaborao do pro-

    jeto de criao do PPGSA. Na ocasio, a rea orte da ps--graduao era a sociologia do trabalho, mas nossa propostaoi bem recebida e aceita.

    Lucia Lippi Oliveira: Ensinei Interpretaes do Brasilpara a graduao como disciplina obrigatria. Escolhi auto-res entre os que compem um panteo do pensamentobrasileiro. Usei textos interpretativos sobre os autores lan-ando mo de obras tais como Introduo ao Brasil:um ban-quete no trpico, 1 e 2, e usaria tambm o recm-publicadoUm enigma chamado Brasil. Em outra ocasio adotei o vis

    de escolher autores cuja interpretao do Brasil calcadasobre territrio, espao, serto, ronteira e regio. Fiz usode documentrios e de lmes de co que ajudam a com-preender as interpretaes textuais. Na ps-graduao dei

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    um curso optativo nomeado Viagens e viajantes. Trabalheicom autores e textos resultantes de viagens que nos sculosXIX e XX construram um imaginrio sobre o pas. Nestecaso usei textos dos autores e imagens do livro O Brasil dosviajantes, de Ana Maria Beluzzo, assim como textos interpre-tativos sobre eles.

    Luiz Werneck Vianna: Leciono h muitos anos, exclusiva-mente na ps-graduao, sempre como disciplina optativa.Meu recurso didtico consiste apenas da discusso em semi-

    nrios de obras de intrpretes selecionados para o curso,quer por temas, quer por recortes cronolgicos. O curso queministrei no segundo semestre de 2010 versou sobre a pro-duo de jovens cientistas sociais sobre o pensamento socialbrasileiro.

    Maria Arminda do Nascimento Arruda: At recentemente,

    era responsvel pela disciplina optativa Formao do pen-samento brasileiro na graduao. As aulas eram sobretudoexpositivas, mas havia a vericao inormal da leitura dostextos.

    Renan Freitas Pinto: Na verdade, a experincia de minis-trarmos no mbito da graduao em Cincias Sociais uma

    disciplina optativa intitulada Formao do pensamentosocial brasileiro na Amaznia terminou se transormandoem um dos pontos de partida para sugerirmos e tambmparticiparmos da organizao de um programa multidis-ciplinar de ps-graduao que ganhou a denominao deSociedade e cultura na Amaznia, atualmente com mes-trado e iniciando um doutorado, no qual tenho ministrado

    por cinco vezes disciplina sobre o Pensamento social bra-sileiro na Amaznia. Ministrei tambm essa disciplina nomestrado do Inpa sobre Agricultura no trpico mido e,por trs vezes, no mestrado de Medicina, Patologia tropi-

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    cal. Alm disso tenho escrito regularmente artigos do tipoensastico sobre temas ans em jornais locais.

    Ricardo Benzaquen de Arajo: Nunca oereci, inelizmen-te, nenhuma disciplina vinculada ao estudo do pensa-mento social brasileiro na graduao. Na ps-graduao,tanto na sociologia quanto na histria, os seminrios quecoordenei sobre o tema sempre tiveram um carter eletivo.No que se reere aos recursos didticos, bem, pelo que medizem, creio que no me atualizei sobre o assunto, pois con-

    tinuo dando aula de modo extremamente convencional.

    Roberto Motta: Eu ensinei pensamento social brasileiro,mas pouco. Minha preocupao com o assunto deriva deminha refexo sobre Max Weber e Gilberto Freyre.

    Rubem Barboza Filho: Normalmente co responsvel por

    uma disciplina anual sobre alguns clssicos brasileiros nagraduao e costumo oerecer outra na ps. No primeirocaso, os alunos leem e discutem obras de Freyre, SrgioBuarque, Faoro, Florestan, Jos Murilo, Werneck e DarcyRibeiro. No segundo caso, como disciplina optativa, o con-tedo varia, e alm destes autores j citados costumo traba-lhar com Oliveira Vianna, Euclides da Cunha, Wanderley

    Guilherme, entre outros. No caso dessa segunda disciplina,ela se organiza por meio de seminrios com um trabalhonal de cada aluno.

    Sergio Miceli: Ensinei Teoria sociolgica contemporneatanto na graduao, mas, sobretudo, na ltima dcada, naps-graduao de sociologia na Universidade de So Pau-

    lo, inclusive a nica disciplina obrigatria que alterna teo-ria clssica e teoria contempornea. Nas vezes em que uiresponsvel pela disciplina, preeri aproundar o examee a discusso de autores-chave no campo da sociologia da

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    cultura (Weber, Elias, Bourdieu etc.). Nos demais semestres,oerecia o curso de sociologia dos intelectuais, ora ena-tizando o prisma comparado entre inteligentzias, ora privi-legiando discusses sobre ontes ou gneros de expressointelectual e artstica, ora mirando em trabalhos de histriasocial da arte, atraindo assim estudantes da ps-graduaoem cincias sociais (em especial, sociologia e antropologia),letras, histria, arquitetura e comunicaes.

    5 Como voc v o futuro da rea de pesquisa do pen-

    samento social? Quais as questes temticas, tericas emetodolgicas que voc pensa serem fundamentais para o

    desenvolvimento da rea?

    Anglica Madeira e Mariza Veloso: Futuro promissor: elostericos cada vez mais rmes com a teoria sociolgica;operaes metodolgicas mais sosticadas; descobertas

    de novas ontes de investigao; necessidade de mantera abertura transdisciplinar do campo; permanente possi-bilidade de releitura dos clssicos e a atualizao de suasobras e crticas.

    Elide Rugai Bastos: Temas centrais ao entendimento dasociedade contempornea emancipao, direito die-

    rena, limites liberdade, aceitao da dignidade comoprojeto social, reconhecimento, excluso/excludnciasocial, para citar alguns oram, de vrias maneiras, objetoda refexo dos autores brasileiros ao longo dos anos, pelaprpria condio no democrtica do pas (colnia, escra-

    vido, sucesso de ditaduras, extrema desigualdade na dis-tribuio de bens etc.). A retomada dessa temtica via pen-

    samento brasileiro, a avaliao dos alcances e limites dosdebates e seus eeitos insere, necessariamente, a refexobrasileira no debate internacional.

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    Glaucia Villas Bas:Acho dicil ver o uturo, mas arris-caria dizer que a rea pode se consolidar e permanecerse houver condies para uma dierenciao interna maisampla. Para isto seria relevante que as pesquisas tomassemnovas orientaes: 1) ossem menos comemorativas e maiscrticas da tradio sociolgica e intelectual; 2) apresentas-sem questes que no digam respeito necessariamente aidentidade nacional e instaurao da sociedade moderna;3) zessem a crtica de categorias como centro e perieriacujo carter geopoltico contribui pouco para aproundar

    o conhecimento das redes de interaes entre intelectuaisbrasileiros e estrangeiros; 4) revisitasse com mais requnciaos cnones interpretativos.

    Lucia Lippi Oliveira: O elenco de temas e objetos da reapensamento social tende a se ampliar para alm da questonacional tratada sob o ttulo de interpretaes do Brasil,

    o que bom e corresponde complexidade da vida social.Por outro lado preciso lembrar que os elementos relacio-nados construo da comunidade imaginada no deixa-ro de continuar presentes. Tenho diculdades para azerexerccio de uturologia! Diria apenas que o undamental ter abertura intelectual para os novos temas e perspectivasque se apresentem.

    Luiz Werneck Vianna: Compreendo que a rea assumiucomo sua a tentativa da produo de uma narrativa que,para alm das diversas matrizes contraditrias presentes emnossa ormao o iberismo, o americanismo , procura,mais do que singulariz-las, instituir modos de articulaoentre elas. Com essa orientao, reconheo que a nase na

    produo de uma narrativa aproxima-se, como na metorade Ronald Dworkin, da escrita de um romance em que cadagerao acrescenta um novo captulo, de uma orma tal queo seu sentido seja a um tempo preservado e superado. Des-

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    sa orma, identico na disciplina a vocao para um esororefexivo, que, ao interpretar o pas, se inclui no movimentodas oras sociais que o transormam.

    Maria Arminda do Nascimento Arruda:A rea de pesquisado pensamento social no Brasil bastante dinmica, haja

    vista o aparecimento constante de jovens pesquisadores eo volume de textos editados. possvel projetar, nesses ter-mos, o crescimento da especialidade entre ns. H temasque poderiam ser mais desenvolvidos: retratos coletivos de

    intelectuais, sistemas de pensamento, movimentos de ideias,relaes entre o modernismo e as cincias sociais, tratamen-to das linguagens, entre outros. Como j me reeri, pensoser undamental evitar tanto o carter pouco rigoroso dosestudos quanto a pesquisa pouco sistemtica. Considero,tambm, que a rea do pensamento social deva aastar deperspectivas muito ormalistas, isto , que tomam os autores

    e as suas ideias como realidades autoevidentes. Do pontovista da sociologia, como sabemos, necessrio elucidar asconexes entre trajetrias, obras, ideias etc. No se trata deprivilegiar anlises externalistas, pois a disjuntiva interno--externo completo equvoco e no se sustenta. Finalmen-te, uma abordagem da cultura do ngulo das disciplinassociais pressupe revelar a ace simultaneamente coletiva e

    particular do pensamento.

    Renan Freitas Pinto: Vejo como undamental para o alar-gamento do campo de pesquisa das temticas relacionadascom o pensamento social a incluso de novas abordagenscapazes de nos ornecerem erramentas pouco utilizadasem nossas anlises e estudos. Por exemplo, autores e mto-

    dos da hermenutica como Husserl, Heidegger, Gadamer,Ricoeur, Habermas e Axel Honneth. Precisamos realimen-tar nossas pesquisas com interlocues com esses autores esuas ideias, assim como com outros autores do campo da

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    crtica da arte, da literatura e da histria cultural, para men-cionar alguns.

    Ricardo Benzaquen de Arajo: A minha impresso, paradar uma resposta curta a uma questo quase impossvel deser enrentada, a de que deveremos, por um lado, apro-undar o dilogo das investigaes acerca do pensamentosocial com as reerncias tericas no s das cincias sociaiscomo tambm de disciplinas prximas, como por exemploa histria em especial a histria intelectual , a crtica lite-

    rria e a das artes visuais e assim por diante; por outro, creioque a constituio de uma perspectiva comparada com opensamento social de outros pases, tal como o que j estocorrendo sobretudo com a Argentina, abre tambmgrandes possibilidades de uma expanso da riqueza e dacomplexidade intelectual das pesquisas nesta rea.

    Roberto Motta: A meu ver a questo undamental ainda a dos modelos de sociedade e de histria. Isto , haverum modelo normativo? J que duas vezes mencionei Gil-berto Freyre, eu diria que uma questo premente est naavaliao, aceitao ou recusa da interpretao reyrianado Brasil, isto ainda mais depois da aparente obsolescn-cia do modelo marxista.

    Rubem Barboza Filho: Vejo com otimismo o desenvol-vimento dessa rea de pesquisa. A sugesto anterior deampliar a comparao com outros pases, no entanto, pre-cisa ser corrigida por uma perspectiva que preserve aquiloque h de original entre ns, para no cairmos no erro dedizer sempre o que no omos e o que no pensamos. Creio

    que o maior desao ser entender que, ao estudar nossopensamento social, tambm produzimos, mais que histriadas ideias, pensamento social. Da a relevncia da questoda democracia para a nossa refexo sobre os clssicos, e a

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    preocupao com a recuperao das nossas possibilidades elimites de vida democrtica.

    Sergio Miceli:A acilidade de acesso s ontes e aos mate-riais de documentao sobre a vida intelectual e artsticatornou praticamente impossvel empreender um traba-lho de investigao relevante sem mobilizar as passagens emediaes entre os diversos universos de prtica social. A-nal, os mundos intelectual, literrio, artstico e acadmicoso universos expostos a coeres e no dependem da liber-

    dade ou da virtude das ideias, e tampouco da livre escolhade seus praticantes.

    l mz shwz proessora do Departamento de Antropologia da USP.

    ad bh

    proessor do Departamento de Sociologia da UFRJ.

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    Fernando ortiz and allan kardec: spiritism and

    transculturation

    This essay explores the importance o Kardecs Spiritism in FernandoOrtizs beginnings and in his long, oten roundabout, inquiry

    leading to the notion o transculturation. In his ormative years

    Ortiz was deeply infuenced by Lombroso but also, like so many other

    writers and intellectuals, by Kardec. He published undamental

    essays on Spiritism, especially on the implications o reincarnation

    or spiritual and social hierarchies. Kardecs doctrine o the spiritual

    progress o the soul allowed Ortiz to argue or a more inclusionary

    national project. Kardecism also provided metaphors that run like a

    thread through Ortizs major works on Arican cultures in Cuba and

    in his poetics. The transmigration o the souls, with its possibilities

    o endless new beginnnings, enabled Ortiz to introduce a spiritual

    and political element into the ar-ranging idea o transculturation.

    Kywd: Fernando Ortiz (1881-1969); Allan Kardec (1804-

    1869); Spiritism; Transmigration; Transculturation.

    simpsio: cinco questes soBre o pensamento socialBrasileiro

    LiLia moRitz SchwaRcz

    andR boteLhoDoze eminentes proessores e pesquisadores respondem

    ao questionrio que objetiva explorar no apenas as con-

    cepes tericas sobre a rea, mas tambm maneiras de

    atuar em pesquisa, lecionar, ormar programas ou elaborar

    cursos. O resultado um panorama consistente da rea de

    pesquisa do pensamento social brasileiro, de seu desenvol-

    vimento, atualidade e desafos.

    pv-v: Pensamento social brasileiro: Pesquisa e ensi-

    no; Interpretaes do Brasil; Ideias e intelectuais.

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    Rss /Abstracts

    symposium: Five questions about the brazilian social

    thought

    Twelve eminent proessors and researchers respond to thequestionnaire that aims to explore not only the theoretical concepts

    about the area, but also ways to work in research, teaching, training

    programs and develop courses. The result is a consistent overview

    o the research area o the Brazilian social thought, its development,

    and current challenges.

    Kywd: Brazilian social thought: Research and teaching;

    Interpretations o Brazil; Ideas and intellectuals.

    o impeachment Do presiDente collor: a literatura eo processo

    bRaSiLio SaLLum JR.

    guiLheRme StoLLe PaiXo e caSaReSO artigo discute a produo acadmica de cincias sociais

    sobre o impeachment de Fernando Collor de Mello, ocor-

    rido em 1992. Examina os trabalhos que, na explicao

    do impeachment, enatizam a relevncia da personalida-

    de do presidente, das instituies e atores polticos ou da

    mobilizao da sociedade civil. Por meio deste balano

    crtico tenta esboaraquilo que parece mais azer alta pro-

    duo acadmica sobre o assunto: um quadro inteligvel

    que articule os atores apontados pela literatura acadmica

    ou por ela s vezes subestimados como responsveis pelo

    impeachment, quadro este que permita caracterizar a din-

    mica poltica que o tornou muito provvel.

    pv-v: Impeachment; Fernando Collor; Brasil; Crise

    poltica; Democratizao.