Y LA IBERICA - repositorio-aberto.up.pt · Introdução Impõe-se, à ... já que para além de...

15
ROMA Y LA PENÍNSULA IBERICA EN LA ALTA EDAD MEDIA. LA CONSTRUCCIÓN DE ESPACIOS, NORMAS Y REDES DE RELACI~N ROM UND DIE IBERISCHE HALBINSEL IM HOCHMITTELALTER. DIE ICONSTRUKTION VON MUMEN, NORMEN UND NETZWERKEN UNIVERSIDADDE LEÓN AREA DE PUBLICIICIONES 2009

Transcript of Y LA IBERICA - repositorio-aberto.up.pt · Introdução Impõe-se, à ... já que para além de...

ROMA Y LA PENÍNSULA IBERICA EN LA ALTA EDAD MEDIA.

LA CONSTRUCCIÓN DE ESPACIOS, NORMAS Y REDES DE R E L A C I ~ N

ROM UND DIE IBERISCHE HALBINSEL IM HOCHMITTELALTER.

DIE ICONSTRUKTION VON MUMEN, NORMEN UND NETZWERKEN

UNIVERSIDAD DE LEÓN AREA DE PUBLICIICIONES

2009

ACTIVIDADE EPISCOPAL NOS SIÉCULOS XIH E XXII EM PORTUGAL:

A INFLUÊNCIIA DA MORMATIVA CONCILIAR

M* Cristina Cuiilia

Univ. d e Oporto

1. Introdução

Impõe-se, à partida, uma precisão no tema da minha co~nunicação, visto o que inicialmente me fora proposto: não abordarei aqui os conflitos normativos, no sentido jurídico do termo, isto é, situações em que uma norma se opõe a outra, de sentido inverso (ou diverso). Aliás, uma tal abordagem implicaria uma análise teórica bastante aprofundada, incompatível com o limite temporal disponível e de natureza algo diversa da que venho desenvolvendo, quiçá iiiesmo com incursão mais no âmbito da História do Direito do que no da História da Igreja ou no da Diplomática. Limitar-me-ei a, na medida do possível, verificar até que ponto a disciplina das regras conciliares emanadas da Cúria nos concílios ecuménicos de Latrão IV (1215) e 1 e I1 de Lyon (1245 e 1279). se detecta na documentação episcopal e capitular da época. sem descurar as imposições decretadas nos concílios de Latrão 1. I1 e 111 (1123, 1139 e 1179) sobre a mesma temática. Gostaria ainda de chamar a atenção para o facto de esta breve exposição não ter tido por base apenas uma investigação em fontes primárias; procurei tão-somente juntar inforinações constantes de diferentes trabalhos que investigadores portugueses têm vindo a publicar com algumas referências documentais que tenho vindo a recolher.

Delimitado deste inodo o âmbito de presente trabalho, proponho- me percepcionar traços da reforma pretendida por Roma. Apesar de a maioria das informações para a época em apreço respeitarem à Diocese de Braga, não deixarei contudo de juntar todas as informações que pude recolher relativas às restantes dioceses, mas contornando sempre, e no possível, as questões de ordem estritamente political que determinaram

1 Esta perspectiva foi feita já há bastante tempo por Carl Erdmann, para o primeiro século da nacionalidade (O Papado e Portugal no primeiro século do história

muitas das intervenções pontificias (quer directamente quer através de Legados) ein assuntos portugueses.

2. Concilios ecuménicos e concílios provinciais

Entre 1123 (ano do Concilio Latrão I) e 1215 (IV concilio do mesmo nome) escoa-se um século de actividade conciliar intensa, em grande parte resultado da conjugação de um conjunto de factores, nomeadaineiite a ruptura entre o Papa de Roiiia e o patriarca de Constantinopla e o sucesso da reforma encetada por Gregório VII. O papado reformador inicia-se logo no séc. XI como o atestam a sequência de siiiodos coiivocados pelos pontifices Leão IX (1049, em Pavia e Reims), Nicolau 11 (1059, em Romaz), Gregório VI1 (1075 e 1078) e Urbano I1 (1095. em Plasencia e Clermont e 19096, em Nimes). É num tal contexto que se inserem os sinodos gerais anteriores ao I concilio de Latrão em 1123: não se pretendia a discussão de novidades teológicas, mas "repensar a Igreja e a sua disciplina".

Concilios e sinodos foram, pois, um importante instruinento de organização da igreja, já que para além de neles s e resolverem conflitos politicos, religiosos, económicos. etc., eram sobretudo lugares privilegiados de debate e definição de liturgia. Dito por outras palavras, nestas reuniões não só se produziam normas. como se procurava, até pela ampla participação de representantes de toda a Cristandade, a sua difusão, almejando uma reforma que se pretendia.

Será sobretudo pela multiplicação dos legados poiitificios e pela realização de sinodos provinciais que a reforma desejada entra, pouco a

portuguesa. Sep. de "Boletim do Instituto Alemão'; vol. V, Coimbra: 1935. São, igualmente incontornáveis os estudos de Domingos de Sousa Costa (Mestre Silvestre e Mestre Vicente, juristas na contenda de Afonso I1 e suas irmãs, Col. Estudos e Textos da Idade Média e Renascimento, n", Braga, Ed. Franciscana, 1963). Maria Teresa Veloso (D. Afonso 11. Relações de Portugal com a Santa Sé duratite o seu reinado, Coimbra, Arquivo da Universidade, 2000) e Maria Alegria Marques ( O Papado e Portugal no tempo de Afo~iso 111: 1245-1279, Dissertação de Doutoramento em História da Idade Média apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1990)..

2 É neste sinodo que<<? papa promulga o decreto 111 nomine Domii~i, que reserva a eleição papal aos cardeais, afastando deste modo o rei da Germâiiia e a aristocracia romana destes processos. "A reforma entra na via institucional e o papado, liberto da tutela dos poderes laicos, toma a partir de então a cabeça do movimento" (FOREVILLE, Raymonde - Latrali I, 11, I11 et Latran IV, Paris, Editions de I'Orante, 1965, p. 26).

Actividade episcopal iiosséculosXII e Xlli

pouco, nas diferentes regiões da peiiinsula italiana, na França, na Aleinanlia. Também chegou à Hispânia, mas aqui "de mão dada" com o esforço de reconquista cristã3, que em termos de história da Igreja se pode traduzir num esforço tendente ao renascin2eiito da vivência cristã lios territórios recuperados, vivência que. não tendo nunca desaparecido coinpletanieiite. era preciso conforinar segundo as "novas regras". Os sinodos diocesanos reflectem a tentativa das autoridades eclesiásticas locais de aplicarem nas suas circunscrições a s normas poiitificias. Os textos saídos destas reuniões, e chegados aos nossos dias, são de extrenia importância pois permitem-nos aferir da maior ou menor resistência social e da capacidade de adaptação do clero às prescrições conciliares.

O papel dos legados pontificios também não pode ser descurado. Ao longo do século XIII, as legacias mais importaiites terão sido a s do cardeal Boso e do cardeal João de Aheville4.

3. Reflexos d o s concílios ecuménicos e m Portugal

No que respeita ao território português, as dioceses fora111 sendo restauradas e reorganizadas a partir de 1071. o que certamente iiuplicou a criação de estatutos capitulares. Se de há muito que os historiadores conhecem este facto, não foram, contudo, ainda feitos quaisquer estudos que nos permitam seguir, em Portugal, a progressão da aplicação dos decretos dos chamados coiicilios ecuménicos na organização das initras e cabidos, bem como na vivência dos cristãos.

Notemos, ein primeiro lugar, e não obstante alguns factos importantes relativos aos processos de eleição e sagração episcopal, que estas nem sempre foram feitas na conforn~idade dos cânones. O problema da definição das dioceses sufragâneas de Braga fez levantar recorrentemente a questão da competência para a sagração dos prelados eleitos, daí resultando a existência de inúmeros diplomas pontificios que, caso a caso. foram dando solução aos conflitos levantados. Não vainos, obviamente, entrar aqui na história que envolve a disputa pelos direitos

3 FOREVILLE, Raymonde - Icatrari (,I/, IIIet Latran /V, p. 26

4 Segundo LINEHAN, ~ e t e r - La iglesia espafiola y ei Popado e i ~ e1 siglo XIII, Salamanca. 1975, p. 23, a principal preocupação da legacia de João de Abeville foi a reforma da Igreja hispânica e a implantação da observância das normas do 1V Concilio de Latrão. "Estas normas reflectem-se nos estatutos redactados para as igrejas particulares C...), Porto e Guimarães em Portugal. (...). A isto há que juntar as directrizes dos concilias provinciais a que presidiu".

inetropolíticos e primazia da peiiiiisula no século XII. Mas i120 nos esqueçamos de actuações como a do arcebispo de Braga D. João Peculiar (e estainos a dar apenas uin exemplo] que foi frequentenieilte excessiva5, nomeadamente iio que respeita à sagração de bispos de Dioceses que iião erain suas sufragâneas, o que levou a interiniiiáveis questões colocadas junto da Santa Sé pelos prelados que s e sentiaiii prejudicados. Nuina visão de conjunto, a eleição dos diferentes prelados portugueses ao loiigo do primeiro século da nacionalidade parece-nos mais condicionada a circunstâncias políticas do que fuiidada iios câiioiies eclesiásticos ou eiii normas pré-estabelecidas6. O mesino s e poderá dizer das eleições episcopais decorridas já no século X111. O processo de alguinas está estudado, iião lia perspectiva do rigor jus-canóiiico, mas nas suas iniplicações políticas7. Há, porém, eleições episcopais que não parecem estar tão directaineiite relacionadas com a evolução política nacional. Aponte-se, a título exemplificativo, dois casos relativos à diocese de Lisboa que nos mostram. por um lado, o desvio relativamente ao estipulado quanto às eleições episcopais, mas por outro, indicadores da exigência de cumprimento do canonicamente preceituado. Efectivamente, o cânoiie 3 do I Concílio de Latráo diz expressaineiite que o prelado que não fosse eleito canonicaineiite deveria ser deposto, bem como aquele que o sagrasse. Ora tal não aconteceu em 1164, quando D. Álvaro assumiu a dignidade episcopal porque para isso fora nomeado pelo seu antecessor, Gilberto de Hastings. A situação provocou o protesto do cabido que se sentiu lesado no seu direito de eleição. Foi nessa altura movido uin processo na Cúria que levou a eleição (por sinal

5 A titulo de exemplo, podemos apontar a actividade de D. joão Peculiar enquanto metropolita de Braga, em cujos direitos muitas vezes se excedeu: nomeou o abade de um mosteiro (S. Cristovão de Lafóes] e conferiu ordens sacras noutro (Santa Cruz de Coimbra) pertencentes a uma diocese que não pertencia à sua província eclesiástica (CUNHA, Maria Cristina Almeida e - A chancelaria arquiepiscopal de Braga (1071- 12441, Ed. Toxosoutos, Série Trivium, n"5, 2005, p. 67, nota 122)

6 Assim, aconteceu, e de forma clara, aquando da escolha do primeiro bispo de Lisboa, consagrado pelo arcebispo de Braga como se fosse seu sufragâneo, o que era nitidamente um procedimento irregular na medida em que Lisboa deveria obedecer a Compostela. Sobd a relação entre os interesses da monarquia e a hierarquia eclesiástica, a propósito deste caso, veja-se BRANCO, Maria João Violante - Reis, bispos e cabidos: a diocese de Lisboa durante o primeiro século da sua restauraçáo, in "Lusitânia Sacra", ZQérie, vol. X (1998). p. 58.

7 Vejam-se, por exemplo, os documentos relativos à eleiçáo do bispo de Lisboa, em 1237, publicados por SOUSA COSTA, Mestre Silvestre e Mestre Vicente ...

Actividade episcopal iiosséculosXU e XIII

do mesmo D. Álvaro) por parte dos cónegoss. Em todo o caso, cerca de 80 anos mais tarde, em 1243, é o arcebispo de Compostela que vai nomear um familiar como prelado em Lisboa, contra a vontade do cabido que defendia a eleição do chantre D. Ricardog. Também esta situação terá levado a queixas junto do pontífice, tendo Inocência IV nomeado juizes para resolverem a questão.

Também são conhecidos casos eein outras dioceses, em meados do século XIV: em Coiinbra, por exemplo, o processo que conduziu à eleição de D. Egas Fafes não terá sido pacífico, porque decorreu numa altura em que tanto ele como os seus eleitores estavam excomungados. Feita inquirição, provavelmente por Fr. Desidério (legado pontificio na Península em 1247- 48), o papa decidiu que D. Egas não deveria ser sagrado pelo arcebispo de Bragalo. Quando este prelado morre, no regresso de Roma, a s é d e Coimbra estava vacante, dada a sua transferência para Santiago de Compostela. O pontífice nomeia então o bispo de Viseu, na altura se encontrava igualmente na Cúria. Mas esta escolha náo terá agradado ao cabido, motivo pelo qual o novo prelado se manterá em Roma até ao início do reinado de D. Dinis".

Isto posto, reportemo-nos a alguns conteúdos do ministério episcopal.

3.1. Visitas pastorais

Entre as várias obrigações dos prelados diocesanos contavam-se as visitas pastorais que os diferentes concílios buscaram regulamentar. Em Braga, tais visitas tiveram lugar desde os primórdios da restauração da diocese apesar da dimensão desta e das dificuldades físicas dos percursos. A actividade do bispo D. Pedro, primeiro bispo de Braga, bem coiiliecida em

8 É possível que D. Álvaro estivesse já associado ao governo da diocese ainda em vida de Gilberto de Hastings. Sobre este assunto, veja-se BRANCO, Maria Joáo Violante - Reis, bispos e cabidos .. , p. 64-65 e FARELO, Mário Sérgio da Silva - O cabido da sé de Lisboa e os seus cónegot (1277-13771, Dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Letras da ~ntversidade de Lisboa, Lisboa, 2003 p. 11.

9 1243, Outubro, 12 (AV., Reg. Vat. 21, ep. 187, fl. 31 v; publicado por COSTA. A. Domingos de Sousa - Mestre Silvestre e Mestre Vicente .... doc. 308, nota 362).

" MARQUES, Maria Alegria - O Popado e Portugal..,, p. 256-257.

11 MARQUES, Maria Alegria - O Papado e Portugol ..., p. 257-258.

termos de organização eclesiástica do território, e o seu s u c e ~ s o r ~ ~ , D. Geraldo, terá igualmente desenvolvido uma intensa "reforma eclesiástica. moral e administrativa, conseguindo assim, por meio de intervenções directas durante as suas frequentes visitas pastorais, eliminar a maioria dos focos de resistência anti-romana da sua enorme diocese" 13. Este prelado morre exactamente durante uma visita pastoral. em Trás-os.-Montes eiil 1108.

No cânone 4 dc Latrão 111, reitera-se a necessidade de cada prelado efectuar a visita diocesana, ao mesmo tempo que se estipula o número máximo de montadas de que cada um se podia fazer acompanhar (no caso dos arcebispos, de 40 a 501, devendo este número variar conforme o grau de riqueza da igreja local. Desconhecernos, até ao momento, qualquer referência directa ao "fausto" ou à "pobreza" manifestada pelos prelados durante as visitas que efectuavam. Mas na diocese de Braga, alguns anos depois. em 1222, o arcebispo D. Estêvão Soares cumpria o preceito, visitando terras transmoutanas, e tanto quanto a docuineiitação então produzida nos deixa entrever, acompanhado de u n ~ pequeno nún?ero de clérigos e de um capelão da sua casa e p i s ~ o p a l ~ ~ , o que nos faz supor que o número de muritadas utilizadas para a realização da visita pastoral seria em número reduzido. E se Braga não era certamente a diocese mais pobre do território. não podeinos deixar de nos questionar sobre as condições em que os restantes prelados do reino cumpririam o que o referido cânone preconizava ...

No que respeita à periodicidade com que essas visitas se efectuavam, apenas conhecemos um documento sobre o assunto: trata-se da autorização concedida em 1235 por Gregório I X a D. Pedro Salvadores, bispo do Porto, de fazer a visita adsacra limina só de três em três anos's.

12 COSTA. Avelino de Jesus da - O Bispo D. Pedro e a organização da Arquidiocese de Braga. 23 edição refundida e amplidda, vol. 1, Braga, 1997, p. 331-332.

l3 MATTOSO, fosé - Dois séculos de vicissitudes políticas, in História de Portugal - vol. //:A monarquia feudol,'~d. Estampa, s.d., p. 37.

14 CUNHA, Maria Cristina Almeida e - A Chancelaria arquiepiscopol de Braga .... p. 126.

15 1325, Outubro. 12 (AV., Reg. Vat 18, ep. 186, fl. 80; publicado por COSTA, A. Domingos de Sousa - Mestre Silvestre e Mestre Vicente ..., doc. 226, nota 336).

Actividade episcopal nosséculosX11 e XIII

3.2. Questões económicas

As visitas a que referimos tinham certamente implicações na vida económica dos "serviços" centrais de cada diocese, sobretudo s e tivermos em conta os gastos a que obrigavam. Os rendimentos de que os prelados dispunham para levar a cabo tais incumbências naturalmente variava. e tinha origem no património de cada igreja diocesana, e que, de uma forma ou de outra, havia repartido entre a mitra e a comunidade capitular (mensae).

As partições do património diocesano, ocorridas desde meados do séculoXll corresponderam a novos moldes das relações entre os cónegos e os bispos, moldes esses imbuídos do espírito de autonomização e decréscimo do interesse da vida comunitária'G. Alguns historiadores têm vindo a associar a divisão das rendas, que a nova situação ocasionou, às disposições do I1 concílio de Latrão, em 113917. Contudo, náo encontámos neste texto conciliar qualquer alusão a esta temática. O câiioiie 5 é o único que s e refere a bens materiais e determina que a manutenção dos bens dos prelados falecidos deveria ficar a cargo &o ecónomo e dos clérigos da Igreja a que esse bispo havia pertencido. Pelo contrário, segundo o cânone 8 do concílio de 1123 (Latrão I) era ao bispo que competia administrar os negócios, tanto os jurisdicionais como económicos, etc. As dificuldades em cumprir tal preceito iiem sempre vinham de fora, mas do próprio cabido, como um documento pontifício de inícios do século XI11 nos assinala: em 1231, Gregório IX manda ao cabido de Braga que não ponha obstáculos ao arcebispo D. Silvestre que pretende sujeitar i mesa arquiepiscopal os bens que dela andavam afastados ilicitamente'8.

Assim, a partilha das rendas eclesiásticas foi sendo feita, sem no entanto haver uma regra comum às dioceses portuguesas. Ein 1145. em Braga, após a divisão do património diocesano. ficaram dois terços dos rendimentos destinados à mitra e o restante para o cabidol9. O rendimento

1"ARELO. Mário Sérgio da Silva - O cabido da sé de Lisboa .... p. 8.

17 MARQUES, José - A arquidiocese de Braga rio século XV, Lisboa, Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1@88. p. 324 e FARELO, Mário Sérgio da Silva - O cabido da sé de Lisboa ..., p. 7-8.

1s 1231, Julho, 24 [A.D.B., Gav. das Propriedades e Rendas da Mitra, doc. 21; publicado por COSTA, A. Domingos de Sousa - Mestre Silvestre e Mestre Vicente ..., doc. 167, nota467).

19 TT., Mitra de Braga, cx. 1, nQO15 (cópia séc. XII); A.D.B., Liber Fidei, doc. 818 e Gav. Privilégios do cabido, nW94 (pública forma de 1300.05.10).

dos bens que cabiam a este deveria ser dividido em tantos benefícios quantos os cónegos, coni excepção de uina parte, que ficaria reservada para fins comuns do cabidozo. Em 1188, o arcebispo D. Godinho procedeu a nova divisão, o mesmo acontecendo em 1214, com D. Estevão21. Também a diocese do Porto, que vira uina priiiieira divisão de bens em 1185, em tudo semelhante à de Braga2z e alterada dez anos mais tarde, vê confirmada a divisão hipartida dos bens em 1200233. Já em Lisboa, poucos anos após a restauração da Diocese (11501 o seu primeiro bispo fizera doação ao cabido de rendimentos necessários ao sustento e ao vestir dos cónegos24. 0s bens foram divididos em duas partes iguais, e não em três terços, como aconteceu em Braga e no Porto, e o prelado desde logo afectou u m conjunto de bens "à alimentação da comunidade canonical (victu)". situação temporária até que existisse uin "refeitório honesto, ao uso e costume francorum" 25. A divisão de proventos que permitiu a "individualização e [respectivo] enquadramento económico" da mitra e cabido de Laiiiego devem ter tido lugar por esta alturaz6, mas obedeceram também a critérios diferentes (são atribuídos ao cabido dois terços das dizimas das igrejas, metade das heranças da diocese e o terço das dizimas e mortuárias d a paróquia da sé). A diocese de Évora Fez igualmente a partição das rendas, em 1200z7, ou seja, alguns anos após a sua restauração. Relativamente a Idaiiha/Guarda, conhecemos apenas um documento de 1243 no qual se faz uma divisão eiii

20 COSTA, Avelino de Jesus da - O Bispo D. Pedlo e a organização da Arquidiocese de Brnga, vol. I, p. 308-309.

21 COSTA, Avelino de Jesus da - O Bispo D. Pedro e a organização da Arquidiocese de Braga, voi. I, p. 308.

2 2 SILVA, Maria João Oliveira - Scriptores et notatores. A produção docunieiitai da sé do Porto (1133-1247), Porto, Fio da Palavra ed., 2008, p. 39.

23 SILVA, Maria João Oliveira - Scriptores et notatores ..., p. 40. Para além da divisão em dois tergos para o bispo e o terço restante para o cabido, "ambas as partes acordaram em nomear conjuntamente um prepositum sive prebendarium que administrasse a dita terça parte do cabido".

ZVARELO, Mário Sérgio da Silva - O cabido da sé de Lisboa ..., p.7-8

25 FARELO, Mário Sérgio da Silva - O cabido do sé de Lisboa ..., p. 10.

Z6 Desconhece-se o.:documento que divide os bens, mas 11.5 uma coiifirma$ão em 1188 e outra em 1240 (SARAIVA, Anisio Miguel Sousa - A sé de Larnego na primeira metade do século XiV(1296-13491, Leiria, Magno Ed. 2003, p. 96).

27 VILAR Herminia Vasconcelos - As dimensões de um poder. A diocese de Évora ria Idade Média, Lisboa: ed. Estampa, 1999, p. 117.

Actividade episcopal nos séculos XII e XIII

três partes das rendas diocesanas28. Mas nesta diocese não são atribuídos à mitra dois terços dos rendimentos, mas apenas um terço (tal como ao cabido). O terço remanesceiite ficou destinado à fábrica da catedral.

Contudo, aquando da legacia de João de Abeville, nos inicios do século XIII, existiam ainda problemas relacionados com a distribuição dos rendimentos. Há já bastante tempo que Linelian chamou a atenção para o facto de o legado pontificio ter tentado "moralizar" a distribuição de benefícios pelos cónegos dos cabidos hispânicos29, lembrando a co~lstituição de Alexandre 111 pela qual os bispos deveriam sustentar os clérigos ordenados sem benefícios. Assim se entende a repartição das rendas feita no Porto aquando da passagem do cardeal por esta cidade.

Relacionado com os rendimentos das initras e dos cabidos, estão obviamente os do restante clero diocesano. E também a este nível deveriam existir dificuldades, porque provavelmente haveria mais do que um cura para cada igreja, o que redundaria em rendas reduzidas, mesmo à escala paroquial.

3.3. A autoridade episcopal

A autoridade episcopal em todo o território diocesano foi igualmente uma das preocupações dos conciliares. Em Portugal, coirio resultado do processo de Reconquista, muitas vezes os prelados s e viram a braços com problemas levantados por mosteiros e ordens iiiilitares que, ultrapassando os privilégios de isenção que a santa Sé Ihes Iiavia conferido. não cumpriam as suas obrigações relativamente ao Ordinário. Apesar de o concilio Latrão Ill ser, a este respeito, claro (o cânone 9 diz expressamente que o bispo deve exercer a sua jurisdição sobre os freires do Templo, do Hospital e das outras Ordens), o certo é que os conflitos foram quase permanentes. A conflituosidade entre o bispo de Évora e a Ordem de Avis é já conliecida30. Mas permanecem ainda por estudar as questões surgidas nas

28 T.T.. Sé de Lamego, Sentenças, doc. 1. m.6. Agradeço à Doutora Maria João Violante Branco não só a referência mas também a cedência do texto deste documento.

29 Vd. LINEHAN, Peter - La iglesia espaiiolay e1 Papado ..., p. 27.

VILAR, Hermínia Vasc~ncelos -As dimensões de um poder. .., p. XX e CUNHA, Maria Cristina Almeida e - A Ordem Militar de Avis (dos inicios a 134.91, tese de Mestrado apresentada à faculdade de Letras do Porto, 1989. A título de exemplo, podemos referir a queixa apresentada pelo bispo de Évora ao Papa sobre a jurisdição em várias igrejas que a Ordem de Avis trazia em construção na Diocese (T.T., Ordem de Avis, n"19).

outras regiões do pais31Eni Braga sabe-se da existência de contendas entre os arcebispos e vários n~osteiros e a Ordein do Hospital pelo menos desde finais do século XiI32, suscitados pela tentativa de se eximirem ao pagamento de tributos à sé, nomeadamente a procuração. Ora, este é exactamente um dos inlpostos consignados no Concilio 1V (câiione 33). que dererininava expressamente que a procuração só devia ser cobrada (pelos prelados ou seus representantes) em caso de manifesta necessidade e desde que houvesse visita. Nesta mesina diocese, são conhecidas várias queixas de D. Joáo Viegas, nos meados do século XI1133. Na tentativa de conseguireiii resolver a seu contento as disputas sobre determinados rendimentos, é possivel que algumas ordens tenham recorrido à justiça secular. Pelo menos. é o que se depreende de uma carta de D. Frei Telo, em 1282, pela qual lembra ao abade de

Peninsula, submeter ao tribunal régio algiimas disputas sobre bens eclesiásticos~~.

íntimaineiite relacionada com a autoridade episcopal está a capacidade exclusiva que os prelados tinham de conferir ordeiis sacras aos clérigos das suas dioceses. A ordenação de clérigos deve ter sido feita, ao longo do período que agora estudamos, segundo a norma canónica. Tanto S. Geraldo como D. Maurício procuraram, nas dioceses de Braga e Coimbra, ordenar clérigos segundo a consuetudo rornaila, já que perguntaram a Ronia se as ordenações feitas segundo o rito toledaiio, ou as feitas por bispos não canónicos, eram válidas3s.

O levantainento da pena de excomuiihão é regulaiiieiitado logo desde o câiione 2 do concilio Latrão I (reafirmado no câiione 3 do Coiicílio 111 quando se proibe que qualquer outro bispo, abade ou clérigo o possa

3' Exceptue-se, no entanto, o estudo do conflito entre o bispo de Coimbra e a Ordem do Templo, estudado por MARQUES, Maria Alegria - "O litígio entre a sé de Coimbra e a Ordem do Templo pela posse das igrejas de Ega, Redinlia e Pombal", in Jornadas sobre Portugal Medieval - Leiria 1983, Leiria 1986, pp. 347-366.

32 Vd. CUNHA, Maria Cristina Almeida e - A Chancelaria arquiepeiscopol de Braga ..., p. 76 e 77.

'3 As Gavetas da Torre do Tombo, 111, Centro de Estudos Históricos Uitramarinos, Lisboa, 1962, p. 325;:

8't

3* MEIRELES, fr. A. Assunção -Memórias do Mosteiro de Pombeiro, p. 129

J: E R D h l A N S , Cari - Papsliii.kuiide!i in l'urruqrii /J>handlungcn der ,\l<adriiiic dei' \Visscnschal~cn i n g3:rtngen. Phil -Hi% Klasse. iicur 1:oi:c. Bd. XX, i iq :?. ticriin. 1970 doc. 8 e 9, e O Papado e Portugal .., p. 20.

Actividade episcopal iiosséculosXI1 eXIII

fazer. Este facto não impediu que ao longo dos séculos XII e X111 (sobretudo neste, devido ao clima de "guerra aberta" entre o episcopado português e a coroa) por várias vezes alguns prelados desafiassem os Interditos e as sentenças de excomuiihão lançadas por outros ou mesmo pelo próprio pontíficc36. A análise jurídica do vasto conjunto de documentos relacionados com o lançaniento de penas canóiiicas e sua violação bem como o levantamento, carece ainda de um tratamento exaustivo.

O Concilio IV lateranense recorda a obrigação que os prelados tinham de convocar sinodos e concílios (c. 6). As referências dispoiiiveis nem sempre nos permitiram distinguir estes encontros, ou mesmo saber s e eram provinciais ou "nacionais". Provavelmente, a sua periodicidade iião seria anual, estando antes relacionada com circunstâncias de índole variada.

Para além dos concilios convocados pelos legados pontifícios, temos, em braga, noticia de reuniões de prelados em 116337, 1175-8830, 1236-3839 e 1261. Este último, convocado por D. Martim Geraldes, para "enfrentar a grave ameaça dos Tártaros sobre a Cristandade", parece-nos estar intimamente relacionado com uma das temáticas mais debatidas no concilio de 1296, e com a coiisequente necessidade de "sensibilizar" o clero bracarense para a libertação de verbas pecuniárias destinadas a esse Fim. Apenas s e conhecem os textos (na integra ou parcialmente) de três sinodos convocados por D. Frei Telo e um de D. Martim Pires de Oliveira*Q. As constituições então promulgadad sobretudo 110 sinodo de 1281, mostram a conformidade das preocupações do arcebispo com as dos conciliares de Latrão, ao nivel da cultura e dos costumes e moral do clero.

36A título de exemplo, podemos apontar o diploma pontifício de 1232, Junho, 25 pelo qual gregório IX denuncia o atrevimento do bispo de oimbra que desprezara a autoridade papal, violando e fazendo violar o interdito lançado pelos comissários pontifícios, e comunica ter-lhe perdoado em atenção à sua velhice. anulando, embora, as suas decisões contra os clérigos fiéis ao Papa [AV., Reg. Vat. 16, ep. 26, fl. 16-17; publicado por COSTA, A. Doniingos de Sousa - Mestre Silvestre e Mestre Viceiite ..., doc. 176, nota 304).

37 Convocado pelo metr6polita D. João Peculiar, com vista 5 canonização de S. Teutónio.

38 Dois concílios convocados por D. Godinho, não se sabe sobre que motivo.

39 Convocados por D. Silvestre Godinho, mas dos quais apenas há referências

'0 5ynodicum Hispanurn. Madrid, Biblioteca de Autores Cristianos, 1981, p. 10-31

3.4. Formação do clero

Em algumas dioceses, não terá tardado a cliegada d o cânoiie 18 de Latrão iii, que estipula a necessidade de rendas destiiiadas para o sustento de um mestre que ensinasse gratuitamelite os meninos pobres das catedrais. Em 1215 (Latrão IV, c. 11) especifica-se que tal beneficio deveria ser consignada ao sustento de um mestre dc Gramática da escola catedraiicia. Em Braga já existia uma escola desde a restauração da diocese. apesar de a dignidade ser referida a primeira vez apelias eiii 114.841. É possível que no Porto, também já existisse a funçáo antes d a dignidade, que apenas surge no tempo de D. Martiiilio Pires (11851. A primeira referência na diocese de Lisboa ao mestre escola data de 116842, embora aqui existisse um chanceler desde 1150. que talvez tivesse funções de ensino coiiio acontecia em Chichester de onde provinha o bispo D. Gilberto. Contudo, e apesar de serem relativamente abundantes as menções a magistri na documentação coiiservada, não encontrámos nenhuma referência especifica ao ensino de deterininada discipliiia. Em Évora, a dignidade de mestre- escola terá surgido apenas entre 1376 e 138243, embora a presença dc mestres e escolares date de épocas anteriores. Em Lamego, a situação sei-ia semelhante já que as funções docentes (a terem existido) foram entregues "pontualmente ou por períodos mais longos" a algum cónego com formação cultural44. O facto de não haver até tarde a dignidade de mestre-escola nestas duas dioceses leva-nos a concluir que só parcialmente o estipulado nos cânones acima referidos era cumprido: s e seguindo o preceituado, alguém com capacidade exercia o ministério do ensino (o que o câiione autorizava), provavelmente devido a falta de recursos económicos. não havia beneficias ou prebeiidas que permitissem o sustento d e uma

" Vd. CUNHA, Maria Cristina Almeida e - A Chancelaria arquiepiscopal de Braga ...., p. 115. Além disso. outras medidas foram tomadas de grande alcance cultural: ein 1173. D. loão Peculiar determina que qualquer cónego que, devidamente autorizado, fosse frequentar os estudos, continuasse a usufruir da sua porção canónica, desde que tivesse a prévia autorização do prelado e do cabido para se ausentar com tal finalidade [A.D.B., Gav. de Privilégios do Cabido, apenso ao doc. 94-A [cópia do século XII); Lilier Fidei, doc. 8191. Aliás, a presença de cónegos com formação superior em Direito é atestada desde muito cedo. conforme aponta NOGUEIRA, j. A. Duarte - A sé de Braga e a recepção do direito romano-caiiónico em Portugal. Actas do Congresso Internacional - 1X Centenário da sé de Braga, vol. I. p. 559.

"2 FARELO, Mário Sérgio da Silva - O cabido da sé de Lisboa ..., p.25.

43 VILAR, Hermicia Vasconcelos - A s dimensões de um poder. .., p. 157

+4 SARAIVA, Anisio M. Sousa - A sé de Lamego ..., p. 115.

Actividade episcopal 110s séculos XII e XIII

dignidade (quer dizer, a dignidade é que iião existia. porque implicava uina prebenda fixa).

Parece-nos igualineiite importante salientar que não obstante a sua precocidade, a "pujança" da escola catedralícia de Braga s e foi esvaindo: apesar do cânoiie 11 do co~icílio IV deterininar a presença d e uin mestre ein teologia nas igrejas inetropolitaiias, não c~icontraiiios qualquer referência i sua existência na documentação bracarense do século XIII.

3.5. Libertação da influencia leiga

Na sequencia dos concilias anteriores taiiibém no Latrão IV (cânones 7 e 8 , 1 4 a 1 8 , 2 9 a 3 1 e 63 a 66) se pretende libertar os cabidos da influencia leiga. Toda esta normativa foi acoinpaiihada de bulas que especificavam assuntos pontuais". No coiijuiito da docu~iientaçáo episcopal e capitular portuguesa anterior ao século XIV há muitos pergaminhos que nos dão conta da iiitei-ferência dos leigos em assuntos eclesiásticos. Assiiii, por exemplo, o cabido de Braga concede a um leigo, em 1184, uma prebeiida do cabido'6. Também se reveste de interesse o breve de Iiiocêncio IV, alcançado a pedido de D. João Viegas, arcebispo de Braga, e dirigido ao deão de Zamora, pelo qual ordena a este que faça cumprir na diocese de Braga o estipulado em Concilio Geral, nomeadamente no que s e refere à perda de direito de padroado daqueles que inatarem, ou de algum modo lesarem, os curas das suas igrejas. numa clara alusão ao cânoiie 45 do concilio 1Vn7. De âmbito mais geral, mas reflectindo a necessidade que a igreja sentia de se libertar da influencia leiga, podemos apontar a bula de 5 de Julho d e 1254, dirigida ao arcebispo de Braga, pela qual o pontifice mandava que este fizesse desistir do direito de padroado que cavaleiros e outros leigos das dioceses de Braga, Porto, Coimbra, Viseu e Lamego tinham usurpado, e que, abusivamente, faziam exigências e vexavam o clero48.

45 Em 1234, por exemplo, é o próprio pontífice quem chama a atenção dos prelados portugueses para o dever do respeito das leis eclesiásticas e proibindo a promoção às Ordens de membros da corte [T.T., Maço 36 de Bulas, doc. 76; publicado por COSTA, A. Domingos de Çousa - iMestre Silvestre e Mestre Vicerite ..., doc 211, nota 332)

46 COSTA, Avelino de Jesus da - O bispoD. Pedro ..., vol. I, p. 311.

'7 A.D.B.. Gav. 1 das Igrejas, nQ2

' 8 A.D.B., Gav. 1 das Igrejas, nQ3

M" Cristina Cunlia

4. Conclusão

Se vários aspectos foram referidos, muitos outros com certeza haveria: condições para ascender ao cationicato, costutnes dos cótiegos e prelados, atribuição de benefícios, cobrança de direitos e tributos, exercício efectivo da jurisdiç20 episcopal ... Grande parte das referências que chegaram até aos nossos dias sobre estes e outros assutitos estão patentes em docuinentação judicial, porque foram objecto de contendas mais ou menos graves entre os prelados e os cóiiegos ou mosteiros, entre estes e os leigos (monarca iiicluído), etc. Cotihecido o conteúdo pelo menos de alguiis destes conflitos, nos seus contornos gerais, permanece ainda por estudar a utilização da norinativa conciliar, ou seja, a sua aplicação.